E viva a liberdade!
"Os mercados têm ineficiências conhecidas e inerentes. Um fator é a falha para calcular os custos de quem não participa destas transações. Estas "externalidades" podem ser gigantes. Isso é particularmente verdade no caso de instituições financeiras. A tarefa deles é assumir riscos, calculando custos potenciais para si mesmos. Mas eles não levam em consideração as conseqüências das suas perdas para a economia como um todo.
Logo o mercado financeiro "subestima o risco" e é "sistematicamente ineficiente", como escreveram John Eatwell e Lance Taylor há uma década, alertando para os perigos extremos da liberalização financeira e revendo os custos substanciais que estão implicados - e também propondo soluções, que foram ignoradas.
A intervenção sem precedentes do Federal Reserve (o banco central americano) pode ser justificável ou não em termos estreitos, mas revela, mais uma vez, o caráter profundamente antidemocrático das instituições capitalistas, feitas em grande medida para socializar o custo e o risco e privatizar os lucros, sem uma voz pública.
Isso não é, é claro, limitado ao mercado financeiro. A economia avançada como um todo se ampara pesadamente no dinâmico setor estatal, com a mesma conseqüência em relação ao risco, custo, lucro e decisões - características cruciais dos sistemas político e econômico."
Eu assino embaixo. A atual crise se difere da maioria das outras grandes crises da história - como a depressão de 1929 e a alta do petróleo em 1973 - por ter suas origens exclusivamente no sistema financeiro e em nenhum outro fator externo, como guerras ou embargos. Além disso, ao contrário de outras turbulências do tipo - como a queda das bolsas asiáticas no final da década de 90 - essa aconteceu bem no seio do templo maior do capitalismo moderno: os Estados Unidos.
Essa é então uma das maiores provas reais de que a economia livre sem controle estatal pode ser muito mais instável e insegura do que se pensava. E se a economia americana continuar desregulada do jeito que é hoje, a situação vira uma bomba-relógio: é só questão de tempo pra próxima quebra. E o poder de fogo dessa bomba assusta: meia dúzia de americanos deixam de pagar a hipoteca por alguns meses e bolsas quebram ao redor do globo, da Armênia ao Zimbábue.
Agora o presidente americano acaba de levar ao congresso uma proposta de ajuda às instituições financeiras em crise de cerca de 700 bilhões de dólares. Somada com as ajudas anteriores, são mais de 1 trilhão de dólares que saírão do bolso dos contribuintes americanos para minimizar os danos causado pela inconsequência dos grandes banqueiros. E o que não deixa de ser irônico é que a solução para a crise no maior reduto neoliberal do mundo é exatamente a intervenção estatal; sem ela, o buraco seria muito mais embaixo.
É o Estado nacionalizando o patrimônio privado, mas ao invés de Bolívia, estamos falando de Estados Unidos, a terra da liberdade. Seria cômico, não fosse tão trágico.